quarta-feira, janeiro 25, 2006

O Último Matador (1996)


Durante os conturbados anos 20, em meio à recessão norte-americana, John Smith (Bruce Willis), um pistoleiro de aluguel, refugia-se de seu passado em Jericó, uma cidadezinha texana quase na fronteira com o México.
Uma guerra entre gangues rivais, de um lado italianos e de outro irlandeses, pelo controle do tráfico de bebida, violando a lei seca, faz com que John reveja seus princípios e utilize seu incrível dom de matar para algo além de dinheiro.
A trama pode aparentar ser mais um daqueles thrillers que se tornaram a marca registrada de Bruce Willis. No entanto, "O Último Matador" possui uma série de diferenciais:

- Já em 1996, o clima noir dessa obra antecipa o papel que Willis viria a fazer em "Sin City". O tom testemunhal, com longas narrações, atrai o espectador para o mundo agressivo e sem esperança de John Smith;
- é quase um filme de faroeste, porém com uma ambientação sui generis. A pequena Jericó, uma cidade fantasma, aproxima-se das villas mexicanas, regiões sem lei e onde a justiça é aplicada a bala. Os tons pardos, a fotografia empoeirada, a sujeira e o sangue são presenças constantes no filme;
- por fim, e possivelmente o maior trunfo de "O Último Matador", é o roteiro magnífico, assinado por Akira Kurosawa e Ryuzo Kikushima.

É curioso que um filme tão bem produzido seja considerado como uma obra menor na filmografia de Willis, principalmente tendo em conta os altos e baixos na carreira deste ator.
Apesar de violações em leis básicas das Física, como pessoas voando após serem baleadas (defeito que se extende a muitos outros filmes hollywoodianos), "O Último Matador" mantém um realismo grotesco do início ao fim.
Vale destacar também a atuação de Christopher Walken, que morre de maneira estúpida, mas que possui uma presença brilhante na tela.
Um filme brutal e instigante.

quinta-feira, janeiro 05, 2006

Moça com Brinco de Pérola (2003)



Em sua "República", Platão afirma que a arte está afastada três graus das idéias.
As idéias elas mesmas estão em primeiro grau; a obra dos artesãos, por ser cópia das idéias, estão em segundo; e a arte, por ser cópia da cópia das idéias, está em terceiro grau.

Tese que "Moça com Brinco de Pérola" parece querer contradizer.
A história se baseia na vida do pintor holandês Johannes Vermeer (interpretado por Colin Firth), o maior expoente da pintura batava depois de Rembrandt. O filme retrata o sutil relacionamento entre o artista e Griet (Scarlett Johansson), sua criada.
É difícil compreender a alquimia de um artista com sua obra e com o ambiente que o circunda, mas "Moça com Brinco de Pérola" capta com maestria o universo de beleza da arte.
Uma fotografia perfeita, brincando com o jogo de luzes e sombras que caracteriza a pintura holandeza do século XVII, mesclada com a beleza puritana de Johansson é a certeza de um mergulho no Belo.
Filmes históricos sempre são facas de dois gumes, pois sempre que se fala em passado - ainda mais de um passado remoto -, vaga-se ao sabor de interpretações. A escolha de Griet como protagonista, ao invés de Vermeer, humaniza a trama e aproxima o espectador do mundo esquecido do povão, relegado aos porões da aristocracia e à tavernas imundas.
As contradições entre ignorância e sensibilidade são reduzidas quando uma mera criada consegue apreender o ofício de seu mestre; quando pessoas supostamente cultas vivem à margem da genialidade; quando o coração de um artista, pelo intermédio de seu fazer, consegue acessar o coração de outra pessoa.

Um filme inspirado.