sexta-feira, maio 20, 2005

Má Educação (2004)



O filme de Almodóvar, "A Má Educação" é metalinguagem pura.
A trama se inicia quando um diretor de cinema, Enrique Goded (Fele Martínez), imerso em uma crise criativa - uma identificação com Fellini parece incidental -, recebe a visita de um rapaz que se identifica como Ignacio Rodriguez (Gael Garcia Bernal), um colega de infância com o qual ele descobriu pela primeira vez os segredos do sexo. Este lhe traz um roteiro escrito inspirado à partir destas reminiscências. A história então se divide em três planos: no tempo presente, relatando a relação de Enrique e Ignacio; no tempo ficcional presente, enquanto Enrique lê o roteiro que narra a história de Zahara, o travesti no qual Ignacio se converteu na idade adulta e que se reencontra com seu amado Enrique; e, por fim, no tempo ficcional passado, abordando o relaciomento de Enrique e Ignacio enquanto crianças, oprimidos por uma rigorosa educação religiosa e tendo de lidar com a pedofilia dos sacerdotes.
Apesar de esta estrutura parecer confusa, Almodóvar consegue montá-la com maestria e coerência (diferentemente de um hábito que tem se tornado prática de dividir o filme em dezena de partes e depois montá-lo aleatoriamente, como em "21 Gramas" e "Pulp Fiction").
"A Má Educação" demonstra muito bem porque este diretor pode ser considerado como um dos grandes nome do cinema da atualidade. Com a excelente atuação de Bernal, este filme se agrega a um momento muito produtivo de Almodóvar, com obras badaladas e que caíram nas graças do público.
Uma crítica aos abusos de padres contra crianças e um mergulho no submundo do homossexualismo (menos do que "Tudo sobre minha mãe") e no das drogas. E, como se não bastasse, uma surpreendente reviravolta na conclusão da história, revelando a complexidade da personalidade humana.

sábado, maio 07, 2005

Pearl Harbor (2001)



Realmente os norte-americanos não nasceram para serem vítimas.
No auge da Segunda Grande Guerra, os EUA preferiam absterem-se de tomarem partido abertamente. Na verdade, por debaixo dos panos, as frotas americanas abasteciam com armamentos, utensílios e alimentos as nações que compunham os Aliados, enquanto que as corporações americanas lucravam rios de dinheiro comercializando tanto com as potências do Eixo como dos Aliados.
O Japão, que se encontrava em frontal oposição à Rússia, à China e à Manchúria, pressentia a iminência do ataque norte-americano, tendo de encarar uma guerra em duas frentes (erro tático que foi fatal para os exércitos alemães). Adiantando-se aos movimentos dos americanos, o exército nipônico realizou um ataque relâmpago a uma base estratégica norte-americana no Pacífico, Pearl Harbor.
Eis o cenário no qual se desenrola o maniqueísta filme de Michael Bay.
Como a grande parte dos filmes hollywoodianos baseados em eventos históricos, tal qual "Titanic", a trama amorosa melosa usada para "rechear" o enredo é desprezível e, na maioria das vezes, nauseante. A atuação dos atores que vivem um triângulo amoroso, os pilotos Rafe McCawley (Ben Affleck) e Danny Walker (Josh Hartnett), e a enfermeira Evelyn Stewart (Kate Beckinsale), é abominável e lembra muito o fiasco de DiCaprio e Winslet no famigerado naufrágio.
É curiosa a perspectiva utilizada, a qual se repetiu no espírito da América após os atentados de 11/9, de surpresa, de incompreensão e de vítimação, como se a nação mais poderosa do mundo (em 1941 ainda despontava como uma potência) fosse intocável. De inocente os EUA não tinham nada e é fato notório que há muito que eles já se preparavam militarmente para ingressar nos combates da Segunda Guerra Mundial. O mais curioso, porém, é que o filme não retrata particularmente o ataque japonês a Pearl Harbor, mas a conseqüente retaliação americana no complexo indútrial de Tokyo. De um descuido estratégico americano, "Pearl Harbor" consegue extrair heróis inverossímeis e cria um ambiente de comoção que afetaria somente alguém nascido "in the land of the brave and the home of free". Neste filme, há a completa ignorância dos processos históricos e dos motores que conduziram àquele estado de coisas.
Os poucos milhares de soldados, militares que juraram proteger seu país com a vida, que pereceram em Pearl Harbor dão o tônus deste filme, sem jamais levar em consideração a morte dos centenas de milhares de civis quando a América, em sua pujança bélica, detona duas armas nucleares sobre cidades japonesas.
Onde está a tão esperada revolução copernicana que tirará do eixo o americocentrismo do cinema?