quarta-feira, junho 22, 2005

Elefante (2003)



Inspirado na história do massacre em Columbine, "Elefante" é um filme pretensioso de Gus Van Sant. Não diz a que veio e não possui mensagem alguma.
A história se desenrola não-linearmente, acompanhando alguns dos alunos de um colégio durante uma manhã cotidiana de aula. Vemo-os debatendo em sala de aula, praticando esportes, participando de atividades extra-curriculares ou simplesmente perambulando pelos corredores da escola. A intenção de aproximar o espectador das personagens, acompanhando-as em seus momentos quotidianos, fracassa, aliás, tem o efeito inverso, já que transmite a sensação de que aqueles alunos americanos de classe média são completamente fúteis, inexpressivos e substituíveis. Tem-se a impressão constante de que são cordeiros indo ao abate e que isto não faz a menor diferença nem tem impacto algum.
Talvez este afastamento seja decorrente da banalidade do crime. É tão corriqueiro ver alunos se digladiando, filhos matando pais, pais matando vizinhos, alunos matando professores e outros alunos, que o filme de Van Sant parece insinuar que uma manhã usual num colégio norte-americano não é completa se não houver um homicídio (o que certamente não estaria muito longe da verdade, tanto lá quanto cá).
O filme surpreende apenas por um aspecto, que é a excelente montagem e o trabalho excepcional dos continuístas. Mas nada que valha a premiação em Cannes.
O espectador sai exatamente como entrou na sala de cinema, com apenas uma diferença, ele terá grandes dificuldades para compreender o porquê do título "Elefante".

Réquiem Para um Sonho (2000)



O segundo filme do diretor norte-americano Darren Aronofsky é uma história brutal sobre sonhos despedaçados. Os conflitos de quatros personagens se interconectam, enquanto todos caminham a largos passos em direção à desgraça: Harry Goldfarb (Jared Leto), um usuário de drogas que tem uma idéia genial para revender narcóticos e ganhar uma boa grana; Sara Goldfarb (interpretada pela genial Ellen Burstyn), mãe de Harry e que se torna dependentes de inibidores de apetite, após saber que poderia ser convocada para participar de um programa de TV e tentar emagrecer para caber no seu vestido mais querido; Marion Silver (Jennifer Connelly), namorada de Harry e também viciada; e, por fim, Tyrone C. Love (Marlon Wayans), amigo de Harry e parceiro na transação que pretendem iniciar.
Mantendo a mesma linha de "Pi", Aronofsky investe na psicodelia e numa edição frenética. O filme é repleto de belíssimas tomadas, imersas numa trama de podridão e decadência. Quanto mais lutam para concretizar seus sonhos (de Sara, ir ao programa de TV, e do trio, Harry, Tyrone e Marion, fazer uma gorda poupança), mais eles se arrastam ao fundo do poço, oprimidos pelas contingências e abusos que eles mesmos perpretam.
Apesar do ar underground , "Réquiem Para um Sonho" é um filme bastante realista e uma advertência para aqueles idealistas que crêem que tudo é possível, bastando um pouco de força de vontade. Esta fábula urbana mostra que quanto maior o vôo, maior é a queda e que são poucos os que estão preparados para agüentar quando as horas difíceis chegam.
Cru, forte e real!

terça-feira, junho 21, 2005

História Real (1999)



O irmão de Alvin Straight sofre um derrame. Com 73 anos de idade, meio cego e com problemas nos quadris, Alvin parte então numa extraordinária viagem para reencontrar o irmão, a quem não vê a 10 anos por causa de uma briga. Impossibilitado de dirigir, ele embarca em seu cortador-de-grama e tenta percorrer os mais de 500 km que separam os dois irmãos.
Talvez este seja o filme mais digestível de David Lynch, narrando uma história da maneira mais linear e simples possível, mas com uma habilidade ímpar.
Baseado na história verídica de Alvin (como o título em português já sugere), "História Real" é uma lição de vida. Estamos tão acostumados a criar problemas ao invés de solucioná-los que apenas com a proximidade da morte constatamos o quanto erramos. Alvin percebe que nem sempre é tarde demais e, na sua rota em busca da reconciliação, ele ensina e aprende com as pessoas que conhece. Lynch consegue dirigir um filme desesperadoramente humano e incrivelmente belo.
Com uma trilha sonora emocionante (que lembra em alguns momentos Dvorák) e uma fotografia inspirada, "História Real" é uma experiência cinematográfica singular. Creio que um diretor que consiga atingir a essência do ser humano como Lynch o fez, deve sentir-se realizado.
Como se ainda fosse possível, este filme ainda conta com a inacreditável e estasiante atuação de Richard Fansworth, que com apenas o olhar consegue transmitir todos os sentimentos de Alvin.
É um roteiro que contraria todas as regras de "ouro" hollywoodianas, mas que consegue aproximar o pequeno universo de Alvin ao nosso próprio mundo, já que suas vivências e aspirações também nos são próprias.
Belo, triste e "demasiado humano".

domingo, junho 19, 2005

Antes do Pôr-do-Sol (2004)



Jesse (Ethan Hawk) e Celine (Julie Delpy) se reencontram, depois de quase uma década, em Paris. Profundamente impressionado pela experiência em Viena, Jesse escreve um romance contando sua história e, no lançamento do livro na França, atrai a atenção de Celine, da qual ele não teve notícias durante todo este tempo.
Os dois jovens idealistas e românticos se converteram em indivíduos melancólicos e pessimistas. Para ambos, a noite em Viena significou um ponto de virada em suas vidas e nada mais foi como antes. Jesse, oprimido por um casamento sem amor, debate-se desesperadamente com as lembranças de Celine; esta, por sua vez, incapaz de se entregar a um amor, após a leitura do romance de Jesse, vê a chama da inquietação e da paixão se reacender.
"Antes do Pôr-do-Sol" responde à muitas das perguntas suscitadas por "Antes do Amanhecer". Contudo, o fim ambíguo do primeiro filme, que abre possibilidades de interpretações tanto otimistas quanto pessismistas, é resolvido com um hábil realismo. Sem coincidências incríveis, sem eventos mirabolantes, mas com um diálogo incrivelmente bem construído, que nos passa a impressão de que é uma inteligente e inquietante conversa cotidiana, "Antes do Pôr-do-Sol" é a conclusão (ou talvez ainda não...) de uma história de desencontros, de fracassos e de desilusões.
No fim, porém, os dois personagens ainda permanecem românticos e capazes de acreditar na mudança e no amor, sem as pieguices e os arroubos de uma juventude ingênua, mas com a bagagem emocional de relacionamentos dos quais extraíram boas e más experiências.
Mantendo-se fiel ao primeiro filme, "Antes do Pôr-do-Sol" traz à tela do cinema diálogos que poderiam ocorrer numa mesa de bar ou na fila de um banco, no entanto, revestidos da talentosa atuação de Hawk e Delpy que conseguem representar as angústias dos jovens contemporâneos.

segunda-feira, junho 06, 2005

O Clã das Adagas Voadoras (2004)



Quando você pensa que o cinema chinês não consegue mais supreender, Zhang Yimou surge com esta de obra arte chamada "O Clã das Adagas Voadoras".
Como o usual, o roteiro é extraído à partir de narrativas lendárias chinesas, as quais relatam que durante a decadência da dinastia Tang, por volta do século IX, um grupo de revoltosos se insurgiu e, aos moldes de Robin Hood, roubava os ricos para ajudar os pobres. Este grupo era conhecido como "O Clã das Adagas Voadoras". No entanto, ao contrário do que o título em português (e o em inglês) indica, a ênfase não é nas artes marciais, mas num triângulo amoroso impossível.
Com uma produção impecável e uma fotografia perfeita, "O Clã (...)" trilha o mesmo caminho de "Herói", transformando o cinema numa experiência visual e sonora total. A atenção dispensada aos mínimos detalhes é um demonstração de respeito ao espectador, pois Yimou trabalha com maestria todo o potencial de ludicidade da sétima arte.
Ao contrário do tradicional roteiro norte-americano, que tem dois pontos de virada principais (um na primeira metade do filme e outro no final), o roteiro chinês é repleto de reviravoltas e sutilezas que nos lançam de um lado ao outro, como numa hábil partida de xadrez. Apesar de se munir de alguns clichês, Yimou consegue utilizá-los sem comprometer a experiência estética do filme, a tal ponto que o espectador passa a esperar a próxima surpresa, fenômeno semelhante ao que ocorre no filme "Charada", com Audrey Hepburn e Cary Grant.
"O Clã das Adagas Voadoras" é um elogio à arte de se fazer cinema e, numa indústria cultural sobrecarregada de lixo, um exemplo de que ainda há um potencial vasto a ser explorado. Zhang Yimou consegue atingir, ou ao menos parece atingir, aquele ideal wagneriano de "Arte Total", unindo uma trilha sonora fabulosa, imagens estonteantes, um balé marcial fantástico e um roteiro trágico de primeira linha.
É o prenúncio de que muito ainda há de surgir nas mãos deste mestre chinês do cinema.

sábado, junho 04, 2005

Guerra nas Estrelas III: A Vingança dos Sith (2005)



O terceiro espisódio desta segunda trilogia parece ser uma concessão feita por Lucas para agradar aos fãs da primeira trilogia.
A nostalgia paira em pequenos e em grandes detalhes. Ao contrário de "A Ameaça Fantasma" e "O Ataque dos Clones", "A Vingança dos Sith" faz constantes referências aos filmes que consagraram, no final da década de 70 e início de 80, George Lucas como um gênio do cinema. Pela primeira vez, desde que se iniciou a produção desta malfadada trilogia (não em termo de bilheteria, já que qualquer porcaria alcança facilmente cifras de milhões de dólares), o espectador pode sentir um pouco da aura da revolução técnica e conceitual que representou "Star Wars: A New Hope" em 1977.
Mas este filme não apresenta novidades. É uma história que todos aguardavam e da qual conheciam um ou outro elemento. Lucas supre a curiosidade dos fãs em saber como se deu a origem do famigerado vilão Darth Vader, porque e como os gêmeos Luke Skywalker e Princesa Léia foram separados, e como o Senador Palpatine angariou o posto máximo de Imperador da galáxia. Se ele foi incapaz de criar uma trilogia que se equiparasse à primeira, ao menos conseguir encerrar satisfatoriamente com este filme.
Contudo, um espectador que só conheça os dois primeiros episódios ("A Ameaça [...] " e "O Ataque [...]") permanecerá em suspensão. É preciso ter uma visão global para relacionar todos os seis episódios e será um tanto difícil para os jovens de hoje compreender porque que certas coisas, tão modernas nesta mais recente trilogia (que ocorre no passado), tornam-se tão toscas e obsoletas do episódio IV em diante. Além disto, todo o mistério envolvendo Luke Skywalker e Darth Vader, que só é revelado no episódio V ("O Império Contra-Ataca"), perde a importância e converte-se em apenas mais um elemento do conflito entre a Força e o seu lado negro.
Ainda há espaço para uma crítica social neste filme e é muito fácil relacionar o autoritarismo e o imperialismo de Palpatine com o governo de George W. Bush. Porém, este tipo de associação pode ser um pouco rasteira, já que desde o primeiro filme (que é o episódio IV), "Star Wars" já direciona seu ataque a uma ditadura opressiva. Apesar de superficial, "Star Wars" aborda os perigos de uma democracia imperialista e enquanto na primeira trilogia isto poderia ser identificado com a Alemanha nazista (os componentes do alto escalão do Império galático tinham sotaque alemão) ou com a ameaça comunista, na segunda há um germe de crítica a estas pseudo-democracias cujo mote "Liberdade" só vale para seus cidadãos.
Alguns poderão até considerar "A Vingança dos Sith" como a obra mais bem acabada de Lucas, contudo, nenhum dos três primeiros episódios jamais atingirá o impacto e o frescor dos três últimos. Não são nem vinte anos de diferença entre eles, mas há mil anos luz de distância qualitativa. Não se pode negar, entretanto, que a crítica direcionada ao episódio IV, em 1977 - de que o filme de Lucas nada mais era do que um filme de cowboys e índios, só que ambientado no espaço -, ainda é válida.
Por fim, não há nada que me dissuada da idéia de que a personagem mais complexa e heróica deste filme ainda seja o robozinho R2D2.