Dizer que Hollywood passa por um período negro não é novidade alguma.
Há uma crise criativa incrível no cinema comercial norte-americano. Parece que o medo de rejeição dominou completamente os roteiristas e, para evitarem o fim amargo dos que ousam, tudo que se produz hoje em dia tem uma cara insossa de enlatados. Filmes saídos direto da linha de montagem. O festival de clichês que se acumulou nas últimas cinco dédacas faz com que quase qualquer filme, drama ou comédia, seja previsível. Espantamo-nos quando podemos dizer:
- Nossa, que filme diferente!
O advento de Charlie Kaufman, com seu "Quero Ser John Malkovich", foi um sopro de inovação em meio ao desgastado paradigma dos filmes americanos. Num misto de realismo mágico e absurdo kafkiano, Kaufman apresentou a luz no fim do túnel: é possível ser criativo e, mesmo assim, comercial.
No melhor estilo kaufmanesco, surge "Mais Estranho que a Ficção", dirigido por Marc Foster e roteiro de Zach Helm. Um filme inovador, mas sem jogar a criança com a água do banho. Aproveita o que há de melhor no paradigma tradicional da escrita de roteiros -- apresentação, ponto de virada, desenvolvimento, ponto de virada II, desfecho --, mas com uma temática diferente e metalingüística.
Harold Crick, interpretado por Will Ferrel, o queridinho cômico do momento, é um auditor da Receira Federal. Num dia convencional, ele começa a ouvir uma voz, narrando tudo que ele faz. Primeiro, ele pensa estar louco, mas logo percebe que esta sugestão não é satisfatória. Crendo-se ser um personagem numa história literária, ele procura a ajuda do professor de Literatura Jules Hilbert (Dustin Hoffman), para descobrir quem é e em qual história está.
O desenvolvimento é brilhante. Esperamos o tempo todo por aquele deslize que derrubará o enredo e transformará este filme em mais uma daquelas comédias simplórias. Mas não; "Mais Estranho que a Ficção" se sustenta, do começo ao fim, sem dar respostas fáceis, sem abrir mão da sua ludicidade, sem tentar nos enganar com clichês.
A prova de que arriscar não é um salto sem rede de segurança; de que é possível sim ser criativo, sem abrir mão do entrenenimento.
4 comentários:
Parabéns pela crítica!
Contine Assim.
Parabéns; um olhar muito pertinente e claro sobre o filme. Me chamou atenção como o diretor e aquipe conseguiram traçar um diálogo´que vai além das palavras. Visitarei você, agora, mais vezes! Paz e bem pra ti
Muito boa sua crítica. Estou estudando esse filme para a faculdade. Pena que poucas pessoas vêem os significados por trás da comédia...
Amei o filme. Procurei muito depois que vi o anuncio. Excelente.
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